Chapei de endorfina. Quer dizer, mais ou menos.
A endorfina pós treino me convence pouquíssimo a voltar a academia no dia seguinte.
Há cerca de um 1 ano voltei a me exercitar e, desde então, tenho conseguido alcançar a tão sonhada constância nos treinos.
Atualmente faço exercícios físicos, pelo menos, 4 vezes por semana; inclusive, já vejo alguns resultados no meu corpo (sim, faço pose bodybuilder no espelho, como adivinhou?), mas ainda assim não sinto toda aquela satisfação que dizem que o exercício traz.
E muitas vezes me sinto frustrada ao pensar que tem algo de errado comigo. Afinal, não “chapo de endorfina” mesmo quando faço 50 minutos de musculação seguidos de 20 de cardio. Ué, não era pra eu estar me sentindo incrível depois de 45 minutos de spinning? Bom, era. Mas tudo o que sinto é vontade de voltar pra casa, ficar deitada em silêncio pelas próximas horas e nunca mais voltar a me mexer. Mas no outro dia lá estou eu de novo. E de novo. E de novo. Numa frequência que nunca tive antes, mesmo sem aquela alegria genuína ao fazer.
E em um dia desses, entre uma série e outra no leg press, comecei a me questionar:
Por que demorei tanto para conseguir ter constância nos exercícios?
Por que, ainda assim, é tão difícil em alguns dias arranjar motivação para ir?
Como enfiar na cabeça, de uma vez por todas, que isso agora é parte da minha vida? Ainda que, na maioria dos casos, eu sinta o total de 0 vontade e prazer com isso?
Ainda não tenho todas as respostas, mas com cerca de 1 ano treinando com frequência, me acho maromba o suficiente para compartilhar algumas reflexões (e até dicas!) com você, minha amiga que também treina na força do ódio.
Menos exercício como punição por não ter o corpo perfeito e mais treinos com o objetivo de ganhar saúde e longevidade
Se você foi criança/ adolescente entre os anos 2000 - 2010, é bem provável que a sua definição de treino seja “uma punição por ter comido mal” e que pensamentos como “não conta como exercício se não estou sofrendo” sejam comuns para você (quem lembra do maldito “no pain no gain?”). Essas definições antiquíssimas e cafonérrimas (sou uma mulher de hipérboles) criam o contexto perfeito para a gente embarcar em um plano de exercícios exaustivo e numa dieta restritiva bizarra que, normalmente, duram muito pouco e nos fazem sentir fracassadas.
E, depois de tanto tempo encarando os exercícios de maneira tão ruim e mentindo que está com cólica menstrual para não fazer as aulas de educação física, fica difícil mesmo mudar essa “chavezinha” na nossa cabeça. Afinal exige - literalmente - movimento da nossa parte. Mas é essencial dar um passo (risos) numa nova interpretação do que se exercitar significa para você.
Com o tempo, muita conversa com nós mesmas e ampliação das nossas referências de saúde e de “corpo ideal”, é possível começar a desvincular os exercícios só da aparência e relacioná-los a pontos mais relevantes para o nosso bem estar como um todo.
Claro que ainda é sobre como a minha bunda tá mais linda do que nunca, mas hoje em dia também é sobre como estou mais bem disposta, com menos dores nos joelhos e tendo melhores noites de sono.
Quando a gente foca em ganhos a longo prazo, a frustração por não sentir tanta alegria pós treino ou ainda não obter resultados imediatos vai diminuindo, porque se movimentar começa a ser parte de um plano maior, da nossa identidade, de quem nós somos, sem metas irreais e sem objetivos megalomaníacos.
Mudar a maneira como vemos os exercícios físicos faz com que seja sobre a gente, onde o foco é na nossa evolução “global”, não só naquela coisa imediatista de querer ter prazer e ganhos instantâneos. É sobre mudar a nossa intenção e criar um conceito mais gentil de atividade física que, durante muitos anos, foi vista de uma forma negativa, especialmente para nós, mulheres.
Um passo de cada vez
A jornada para começar a se exercitar e desenvolver uma constância não exige que a gente dê grandes passos e faça mudanças gigantescas. Também não é necessário se forçar a fazer algo que odeia completamente. Existem formas pequenas, possíveis e variadas de adicionar os exercícios ao nosso dia a dia sem gastar muito ou ter que acordar às 5h da manhã.
Tenho certeza que consegue pensar em atividades que sejam minimamente agradáveis para você - andar de skate, dançar, nadar. O problema é que fomos condicionadas a acreditar que atividades como essas não “contam” como exercício, porque são divertidas, podem ser realizadas fora da academia e não parecem nos causar alguma dor e sofrimento. Mas elas contam sim!
Estarmos em movimento e conectadas à atividade que estamos a fazer é a prioridade; isso é muito mais importante para o nosso bem estar do que nos forçar a executar algo que não gostamos.
Aproveitamos melhor os exercícios quando os vemos como uma forma de nos ouvir, nos conectar com os nossos corpos e celebrar o quão poderoso eles podem ser. Por isso, tente até encontrar algo que você não odeie tanto antes de desistir completamente da atividade física e deixar as suas leggings só para faxinar a casa.
Vai sem motivação mesmo
A gente tem uma mania, e eu falo com muita propriedade, de esperar estímulos vindos de terceiros. Como se a gata fitness do Tiktok ou o nosso amigo que já treinou as 7h da manhã fossem despertar em nós uma motivação surreal capaz de nos levar voando até a academia. Mas a realidade não é essa. A motivação raramente aparece (e quando aparece dura pouco, então não dá pra contar com ela) e algumas coisas precisam ser feitas mesmo que sem vontade (bem vinda ao mundo real).
No Instagram, perguntei aos seguidores que treinam com frequência, o que os ajudam a manter a constância nos treinos. Entre as respostas que mais apareceram estão:
“Trato como uma obrigação, algo inegociável”;
“Encaro como um hábito essencial, não é discutível”;
“Um compromisso pessoal”.
E adiciono a minha contribuição: sempre que não estou afim de treinar (aka todos os dias), penso “se fosse uma reunião de trabalho eu não faltaria” e isso ajuda a reforçar o meu comprometimento comigo mesma. No meu caso, a constância veio quando entendi que os treinos nada mais são do que uma repetição dia após dia daquilo que precisa ser feito por mim e para mim.
Esperar por um sentimento maravilhoso que vai nos preencher de vontade de nos exercitar é uma ilusão, porque isso acontece muito pouco (quando acontece). Por isso, é importante criar (devagarinho 💖) os próprios estímulos para não desistir; tentar, tentar e tentar até a nossa mente e corpo assumir determinado comportamento como parte da nossa identidade. Cada vez que a motivação não aparece e a gente encontra um jeitinho de não desistir, uma conexão com nós mesmas se estabelece. E pronto, tá pago.
Se movimentar é uma escolha nossa e temos o total direito de descansar quando estivermos cansadas ou esgotadas. É preciso respeitar o nosso corpo e fazer a escolha que achamos ser melhor para nós naquele momento; mas só dá para fazer isso quando a gente se conhece e quando somos honestas com nós mesmas.
E isso envolve conversar consigo da maneira mais transparente possível e se perguntar: não estou fazendo isso (neste caso, treinando) por motivos que não estão no meu controle ou só estou usando como justificativa para não sair dessa inércia? As desculpas que repito a mim mesma tem um fundo de verdade? Se sim, o que e como posso fazer para contorná-las? Existem maneiras alternativas e leves para mudar este cenário aos poucos? Consigo pedir ajuda?
Eu conheço todas as minhas desculpas e, vez ou outra, uso alguma delas para não fazer nada, me movimentar o mínimo possível. Mas isso não pode ser a regra da minha vida e sim a exceção; entender as próprias limitações é diferente de passar pano pra gente mesma o tempo todo, sabe? E não, não dá para evitar todas as batalhas.
Claro que não estou levando em consideração quem passa 4 horas no transporte público pra ir e voltar do trabalho, estuda, chega em casa e faz comida, limpa a casa, cuida de si mesma e até da família.
Em alguns momentos da vida os exercícios físicos realmente não vão ter lugar na nossa rotina e tudo bem; é momento para focar em você de outras formas. O papo aqui é para quem, assim como eu, está numa fase em que é possível inserir os treinos na agenda sem ter que abrir mão de muitas coisas. Tranquilo, tá? <3
Ter responsabilidade com a própria saúde mental e física é um trampo e assumi-lo é difícil mesmo, mas não dá pra adiar muito - uma hora a conta chega.
Eu ainda luto muito para entender os exercícios físicos como parte da minha vida. Ainda é difícil para mim entender que não é algo que eu posso deixar pra lá, que posso optar por não fazer nunca; aliás, até posso, mas já conheço as consequências disso. Renovar esse compromisso é uma ação diária que escolho fazer ainda com muito custo - alguns dias com raiva, outros sem pensar muito, outros até com alguma alegriazinha. Mas é com o foco lá na frente que eu reafirmo a promessa que fiz a mim mesma de ter um futuro a médio/ longo prazo com saúde e autonomia. Cuidar de mim dessa forma é como um voto de esperança no que pode vir aí.
Eu quero ser alguém que consegue viajar e aproveitar as coisas boas da vida que hoje tenho acesso, quero ser uma mãe que consegue acompanhar o desenvolvimento da minha criança com disposição, quero ser uma idosa forte e independente, com a coluna ereta e os braços fortes (para varrer a calçada às 7h da manhã 🤪).
Espero, de coração, que esse texto não tenha soado pedante, elitista ou sem noção. A intenção foi compartilhar a minha vivência sobre isso e trazer uma perspectiva menos “mirabolante” sobre um tema que ainda parece tão distante pra gente.
Se uma gatinha se sentir disposta a calçar um tênis e dar uma volta na rua depois de ler isso, já tô feliz. Juntas vamos formar o Clube das Mais ou Menos Chapadas de Endorfina. Um passo (na esteira ou na rua) de cada vez.