Por que eu parei de beber?
Não é de surpreender que, quando parei de beber há mais de um ano, senti como se estivesse passando por uma crise existencial.
Questões do tipo “quem sou eu agora que não bebo mais?' e “como vou lidar com situações sociais sem álcool?” surgiram dramaticamente e confesso que, mesmo satisfeita e orgulhosa da minha decisão, foi doloroso abrir mão de uma parte de mim mesma que eu achava que me trazia alegria.
O confronto com o espaço vazio a ser preenchido foi grande.
E uma das coisas que me ajudou neste processo foi descobrir, entender, acolher e manter em mente os motivos pelos quais decidi parar de consumir álcool; não para me explicar quando alguém me perguntava (apesar de ajudar muito), mas para justificar pra mim mesma e não desistir.
Hoje compartilho com você algumas dessas razões.
1. Eu achava que beber me permitia ser 100% eu mesma. Quando, na verdade, me fazia ser outra pessoa.
Apesar de me dar uma “auto segurança”, o álcool não me ensinava a ser uma pessoa segura. Ele não me ensinava a como me amar de verdade.
Toda a pseudo confiança que as bebedeiras me traziam eram uma ilusão, porque no dia seguinte eu me sentia a pior pessoa do mundo, arrependida até de coisas que não fiz. Aí, toda a personalidade maravilhosa que eu achava que tinha quando estava bêbada sumia e eu ficava sozinha com as minhas verdades. E claro, eu não sabia e não me permitia aprender a lidar com elas.
Aí, junto com a ressaca física, vinha a famosa ressaca moral. E, no meu caso, esta se estendia por muito tempo; eram longos dias (após beber) sentindo muito remorso, vergonha e culpa.
Comecei então a me sentir muito cansada de viver essa mesma história tantas vezes e fui me convencendo de que merecia experimentar uma vida em que esses sentimentos fossem menos frequentes.
2. Beber me mantinha presa a velhas narrativas e não permitia que eu criasse novas histórias para a minha vida.
Se todos os rolês e amizades que eu fazia giravam em torno do álcool, em que momento e com quais pessoas eu tentaria coisas diferentes?
Além disso, os efeitos do álcool na minha ansiedade e depressão duravam dias e, quando começavam a passar, eu bebia de novo. Esse ciclo não me deixava acessar quem eu era de verdade e eu vivia me relacionando com uma versão limitada de mim, sem conhecer os meus diferentes interesses, vontades e sonhos.
O resultado disto era uma rotina que girava sempre ao redor das mesmas atividades, dos mesmos sentimentos e narrativas; sempre distante das mais diversas possibilidades que eu poderia experimentar.
Então, eu parei de beber porque sentia cada vez mais essa necessidade de aprender sobre mim, descobrir a minha complexidade, me conhecer a fundo e o álcool mascarava a parte mais real de quem eu sou, além de me manter presa nos mesmos rolês, com as mesmas pessoas, fazendo e sentindo sempre as mesmas coisas.
3. Eu bebia porque achava que só conseguiria ter vida social e fazer amigos dessa forma
Esse ponto fala muito com o primeiro.
Por só me julgar uma pessoa legal quando bêbada, eu achava que pra conseguir fazer e manter amigos eu tinha que estar sempre bebendo com eles. Afinal, ninguém ia suportar a minha chatice se eu estivesse sóbria. Então eu usava o álcool como uma ferramenta para me ajudar a ser alguém mais maleável, mais divertido, mais solto, menos rigoroso - sem ele, eu me sentia deslocada, não conseguia me adaptar e me inserir nas conversas.
E preciso tornar esse problema também coletivo; é comum e super aceito que as pessoas só se reunam pra tomar “uma”. Até os nossos dates são regados a bebidas alcoólicas e, inclusive, isso é usado muitas vezes para nos deixar, teoricamente, mais relaxados, principalmente nas primeiros encontros com alguém.
Então, não é exatamente algo meu achar que só dava pra fazer amigos e socializar bebendo. A gente cresceu convencido de que não dá para ser alguém com uma vida social ativa se não for dessa forma.
E spoiler: dá sim.
E como eu consegui parar?
Tomando uma decisão.
Decidindo me escolher, decidindo criar espaço para que a pessoa que eu queria ser se desenvolvesse. Escolhendo as relações e a vida que eu queria ter, assumindo o controle consciente não só do meu comportamento, mas também das atividades, pessoas e lugares com os quais eu tenho contato.
Decidi que eu valia a pena.
Que valia a pena também abraçar os meus sentimentos - até o pior deles, sem a máscara do álcool. Decidi que estava disposta a encarar os meus medos e inseguranças sem falsas muletas e que queria estar realmente presente nos meus bons e maus momentos.
Escolhi entrar em harmonia com o meu corpo e, removendo o álcool da minha rotina, ficou claro que beber era o que mais mantinha a minha mente e o meu corpo desconectados, alimentando minha ansiedade e me causando vergonha, remorso e tristeza.
Decidi que valia a pena aprender a fazer e manter amizades com honestidade e também ver a mim mesma dessa forma (mesmo que isso seja desconfortável, às vezes).
Não me sinto completamente bem - ainda tenho dias difíceis, mas ficar sóbria tornou possível lidar, até com os momentos mais complicados, de forma mais simples e acolhedora. Não há mais espaço para a auto depreciação e para a culpa. Hoje, mais de 1 ano depois, me sinto dona de mim, no sentido de me conhecer completamente, de saber onde dói, o que me traz alegria e, principalmente, o que eu não quero mais pra mim.
Aprendi a acolher o desconforto como parte da minha vida e não fugir mais dele. Aprendi também que tudo fica mais real e gostoso de se viver quando eu estou sóbria.
Esse texto é o “roteiro” que fiz para o reels que postei no meu instagram esses dias. Se quiser, pode assisti-lo (e compartilhá-lo 😏).
Para ler:
Foi aí que eu decidi parar de beber 🚫🍷 (o primeiro texto que publiquei sobre esse assunto)
Aniversário de sobriedade (a news quando fiz 1 ano sem álcool)